Um discurso (não tão) encorajador de 8 de março
- Luma Deffendi
- 8 de mar. de 2024
- 2 min de leitura

Eu já deixei bem claro que eu adorei o filme da Barbie e beijinho no ombro pros haters. Mas achei providencial vir aqui hoje, especialmente hoje, pra enfatizar que, pra além da estética plastificada e colorida, das atuações dignas ou não de prêmios e da memória afetiva que a produção despertou em mim, o que me tirou o fôlego mesmo (e também me arrancou várias lágrimas no cinema) foi o discurso visceral, dolorido e amplamente real da personagem da America Ferrera. Quando ela fala pra Barbie padrão sobre o quanto é “praticamente impossível ser mulher” nesse mundo (no mundo das bonecas também, claro), poxa vida, isso me pegou muito. Me doeu real oficial.
A verdade é que ser mulher nessa estrutura caótica e machista significa, dentre outras coisas, que SIM, sempre estaremos erradas ou seremos culpadas por algo. Inclusive por tudo aquilo que nem fizemos, simplesmente porque não temos o direito de fazer. E essa exaustão que sentimos diante dessa dinâmica não cessa nunca. Ela só aumenta... A gente abre uma página na internet e tá lá mais uma mulher entrando pra estatística: de assédio moral a feminicídio, ocupamos todos os piores lugares possíveis na esfera social.
“Mas, Luma, queremos um discurso de 8 de março encorajador e não mais uma trágica leitura da realidade.”
Eu também queria, manas. E acredito, profundamente, que talvez no futuro isso seja possível. Só que hoje em dia, sendo uma mulher feminista, não consigo apenas defender passivamente e por meio de palavras bonitas a ideia da igualdade de gênero. Eu preciso, às vezes de um jeito mais enfático e duro, usar a minha voz e direcionar as minhas ações pra desafiar estereótipos, ampliar a representação feminina nas instituições, apoiar outras mulheres e contribuir para a desconstrução de normas patriarcais. E, veja bem, trabalhar na promoção desse mundo mais justo e inclusivo, passa pela descrição de uma realidade cruel que precisa, urgentemente, passar por mudanças drásticas.
Ser mulher em um mundo machista implica enfrentar uma série de desafios e obstáculos decorrentes de normas sociais aprisionantes e isso é trágico. Como poderia não o ser se todos os dias somos violentadas física, sexual, mental e afetivamente por ações sustentadas pela cultura do estupro que atribui a nós, e não aos verdadeiros agressores, os homens, a culpa pela propagação de todas essas violências? Como meu discurso poderia ser tomado de gratidão se a desigualdade de gênero à que somos submetidas limita as nossas oportunidades profissionais mesmo que nada no desempenho das nossas funções justifique tal disparidade? Como parecer enérgica e esperançosa se estamos exaustas de carregar o peso dos estereótipos que nos atribuem independente do que façamos? No fim das contas, acabamos sempre tachadas de gordas ou magras demais, loucas ou passivas demais, burras ou prepotentes demais...
É... Eu sei. Ser mulher nessa sociedade é adoecedor.
No fim das contas, falar tão abertamente sobre isso, cutucando a ferida diretamente onde dói, funciona sim como um discurso encorajador. Uma vez identificada a ordem do sofrimento, abrimos caminho pra cura. E, mulheres, tenho que dizer, a nossa existência depende disso: de levantarmos a voz em uníssono pra resistir e desafiar tantas dessas normas vigentes, bem como de agirmos diretivamente na construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Então R(existamos)!
Sintam-se abraçadas (e encorajadas)! ❤️
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